quarta-feira, 14 de novembro de 2007

O prestígio dos heróis anónimos


Faz agora cinco anos que ondas negras vestiram de luto a costa galega, impondo um velório ambiental que se arrasta penosamente até aos nossos dias.

As entranhas tóxicas do Prestige envenenaram de morte as praias tão frias quanto belas que se estendem do topo norte de Portugal ao Sul de França.

Milhares de aves e peixes sucumbiram de imediato e muitos outros depois, não resistindo ao terrível impacto na cadeia alimentar e no ecossistema.

Nos dias que se seguiram, milhares de ambientalistas e populares acudiram, dando aquilo que tinham e que não tinham para minorar os estragos.

Perante a incapacidade dos planos de respostas oficiais, estes anónimos foram os verdadeiros heróis deste drama singular.

Mal equipados, munidos apenas de fatos pouco adequados, luvas e galochas; não temeram as recomendações e enfrentaram um mal que era então maior.

Sabe-se hoje que as máscaras que usaram não eram as apropriadas. Sabe-se hoje que inalaram substâncias tóxicas e altamente cancerígenas, que foram envenenados pelo fuel-óleo.

Sabem agora que mal conseguem respirar de noite, sabem agora que sucumbem a cancros tão letais quanto repentinos, sabem agora das possíveis alterações genéticas, sabem agora que aquele gesto pode ter-lhes custado a vida.

Eu… não consigo imaginar acto mais nobre e mais valioso e não consigo perceber o silêncio surdo dos governos.

Porque não implementar um programa de apoio, de indemnizações, de triagem dos casos mais graves?

Será que este Estado que todos nós criámos, portugueses e espanhóis; será que esta casa imensa que somos todos nós não estará lá também para nos apoiar quando precisamos e a ele acudimos?

Será que esse ente supremo e imaterial tomou a forma de uma concha que só serve para quem lá está?

A muitos desses corajosos anónimos nada mais restará que o conforto da sua consciência.

A brisa suave que embala as ondas e aconchega as rochas negras dessa costa fria e silenciosa, há-de clamar sempre por eles em sussurro… eternamente reconhecida.

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