quinta-feira, 8 de outubro de 2015

displicência

I
s.f. Disposição daquele que não tem o menor cuidado com as coisas.
Qualidade ou particularidade daquilo que está ou permanece displicente; aborrecimento, desgosto.
 (Etm. do latim: displicentia)

dis·pli·cên·ci·a
(latim displicentia, -ae, desgosto, descontentamento)
substantivo feminino
1. Qualidade ou estado do que é displicente.
2. Desgosto, desprazer, dissabor.
3. Qualidade do que é insípido ou sensabor. = INSIPIDEZ, SENSABORIA
4. Negligência, desleixo, desinteresse. ≠ DEDICAÇÃO, EMPENHO, INTERESSE

"displicência", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, http://www.priberam.pt/dlpo/displic%C3%AAncia [consultado em 07-10-2015].~~


II
O nosso concelho, o meu concelho chegou a isto: hoje quando saí, pensando no assunto, cheguei à fonte da Pipa e… voltei para trás de propósito, para fotografar esta imagem. 




O cartaz tinha sido colocado no sentido de quem desce de Marvão, ou seja, de quem já vem da festa que está a anunciar. O erro grosseiro começa logo por aí. Mas não encobre o maior: anuncia a festa a 2, 3 e 4 de Outubro. Hoje estivemos a 7.
3 dias depois do fim. E a minha cabeça só pensava, naqueles breves quilómetros de Marvão até ali, na quantidade enorme de funcionários da câmara, de pessoas ligadas à autarquia que passaram pelo cartaz e assobiaram para o lado. Muitos destes com razão, pensando que isto seria o trabalho de outros. Outro pensariam que seria o trabalho de ainda outros e… a pensar, a pensar, foi ficando. A imagem de desnorte que este episódio dá, é perfeitamente sintomática e reveladora de tudo quanto está para trás e nós não vemos.

Conto um episódio da minha vida particular. A minha filha Leonor está a atravessar a adolescência com toda a rebeldia e trejeitos da fase. Por vezes, ao ter que colocar a mesa em casa, faz o que tem de ser feito com um desleixo… que se nota. E eu digo-lhe: “Leonor, o amor com que se faz as coisas passa para os outros. É o amor que nos distingue dos outros. A mesa colocada assim, dá um ar que foi posta à pressa, sem ordem, com os talheres para um lado e os guardanapos para o outro. Se isto fosse um restaurante, não me surpreenderia se os clientes saíssem e temessem pelo que se passa na cozinha, a ser este o aspeto da sala...”

Eu sei que a comparação pode ser excessiva, mas por certo que resulta. Consegue transmitir tudo o que quero dizer.

Se numa simples targa que toda a gente vê ao passar, transparece este “deixa andar”, o que dizer de tudo aquilo que vai no convento, que só sabe e bem conhece quem está lá dentro?  

É importante que quem está hoje em funções, aos comandos do navio, perceba que há gente livre, que não tem medo, que não depende de um empregozinho que merece o seu amén, que tem o cadastro limpo, os impostos pagos, e liberdade para agir e pensar e dizer, olhos nos olhos se for caso disso, que há outra maneira de fazer as coisas. Diferente, mas certamente melhor.

No meu tempo, no tempo em que o pelouro da Cultura dependia de mim, raios ma partam se eu deixava que isto acontecesse. Aquele cartaz, colocado num sentido contrário, a cada dia que passa depois da festa é um sufoco e um garrote a apertar o pescoço de quem manda. Desde que se rale.

Só podem ter outras preocupações, outras coisas em que meditar, tantas, muitas outras coisas porque a imagem que passa, a mensagem é de desleixo, de displicência.

Daí a definição que abre este desabafo.

A propósito, lembrei-me da alegoria da caverna do Platão cujo resumo encontrei e alinhavei aqui.

III
O Mito da Caverna, também conhecido como “Alegoria da Caverna” é uma passagem do livro “A República” do filósofo grego Platão. É mais uma alegoria do que propriamente um mito. É considerada uma das mais importantes alegorias da história da Filosofia. Através desta metáfora é possível conhecer uma importante teoria platônica: como, através do conhecimento, é possível captar a existência do mundo sensível (conhecido através dos sentidos) e do mundo inteligível (conhecido somente através da razão).


O Mito da Caverna
O mito fala sobre prisioneiros (desde o nascimento) que vivem presos em correntes numa caverna e que passam todo tempo a olhar para a parede do fundo que é iluminada pela luz gerada por uma fogueira. Nesta parede são projetadas sombras de estátuas representando pessoas, animais, plantas e objetos; mostrando cenas e situações do dia-a-dia. Os prisioneiros dão nomes às imagens (sombras), analisando e julgando as situações.

Vamos imaginar que um dos prisioneiros fosse forçado a sair das correntes para poder explorar o interior da caverna e o mundo externo. Entraria em contato com a realidade e perceberia que passou a vida toda analisando e julgando apenas imagens projetadas por estátuas. Ao sair da caverna e entrar em contato com o mundo real ficaria encantado com os seres de verdade, com a natureza, com os animais. Voltaria para a caverna para passar todo conhecimento adquirido fora da caverna para os seus colegas ainda presos. Porém, seria ridicularizado ao contar tudo o que viu e sentiu, pois os seus colegas só conseguem acreditar na realidade que vêm na parede iluminada da caverna. Os prisioneiros lhe chamarão louco, ameaçando-o de morte caso não pare de falar daquelas ideias absurdas.


O que Platão quis dizer com o mito
Os seres humanos tem uma visão distorcida da realidade. No mito, os prisioneiros somos nós que vemos e acreditamos apenas em imagens criadas pela cultura, conceitos e informações que recebemos durante a vida. A caverna simboliza o mundo, pois apresenta-nos imagens que não representam a realidade. Só é possível conhecer a realidade, quando nos libertamos destas influências culturais e sociais, ou seja, quando saímos da caverna.


Para terminar…

Se querem, conseguem e ficam bem apenas a ver as sombras…

Sem comentários: